" O fato de quem filosofa - sobretudo quando se ocupa da dinâmica da formação e da realização do ser humano - dedique especial atenção a meditar sobre a essência da música , não é casual nem movido por " interesses musicais "pessoais . Essa atenção especial remete ,antes a uma grande tradição que remonta quase à origem dos tempos , a Platão , a Pitágora e às doutrinas de sabedoria do extremo oriente. E isto não se deve somente ao fato de a filosofia ter por objetos coisas " espantosas"(para as quais , como afirmam Aristóteles e Tomás de Aquino , deve especificamente voltar -se quem filosofa )-não é somente porque a música é mirandum , uma das coisas mais maravilhosas e misteriosas do mundo . Não é só , tampouco , pelo fato de que " musicar " é uma atividade da qual se poderia dizer que é um oculto filosofar- um Exercitium Metaphysices Occultum - da alma que , sem saber , filosofava , como diz Schopenhauer na sua profunda discussão para o estabelicimento de uma metafísica da música. O que a música sempre traz - e este é o fato mais decisivo - ao campo de visão do filósofo é a sua proximidade da existência humana , uma característica específica que torna a música necessariamente objeto essencial para todos os que refletem sobre a realização humana.
A pergunta que especialmente fascina o filósofo que medita sobre a essência da música , é : o que propriamente percebemos quando ouvimos música ? Pois, sem dúvida , trata-se de mais ( e de outra coisa )que os sons resultantes do roçar as cordas do violino , soprar a flauta ou percutir o teclado - isto tudo ouvem também os mais insensíveis . O que é , então , o que propriamente percebemos , quando ouvimos música de forma adequada ?
Para as outras artes essa mesma indagação propõe-se mais facilmente - ainda que a pergunta : " O que é que propriamente vemos quando contemplamos o Rasenstuck de Durer? "também não seja fácil de responder , pois certamente não é o céspede que se apresenta à vista , na natureza ou numa foto- não é este " objeto " que nós propriamente vemos , quando observamos um quadro de forma adequada. O que realmente percebemos quando ouvimos um poema , quando aprendemos a poesia de um poema ? Certamente é mais ( e é outra coisa ) do que foi " objetivamente " proferido( isto tem sido identificado na poética como uma impureza , mas é uma " impureza " sem dúvida necessária ).Estas perguntas são pois , igualmente difíceis de responder.Agora porém , a pergunta : o que capta quando se escuta música de " maneira musical "? será que se trata de um objeto , como nas artes plásticas ou na poesia - onde sempre algo precisa ser representado , algo precisa ser dito ( algo objetivo)? A questão não remete a um objeto neste sentido , mesmo quando até grandes músicos muitas vezes pensem que remeta. Não , não é uma " Cena junto ao riacho" ou uma " Tempestade "ou uma " Sociedade alegre dos camponeses"o que propriamente se capta quando se ouve a sexta sinfonia de Beethoven. E o que ocorre com a " Canção " ( Gesang) ?
Não ficaria - pelo menos neste caso - por conta do texto proferido , o que propriamente percebemos quando uma ária ou um recitativo são cantatos ? Certamente , ouvimos as palavras.Mas percebemos-quando a música é autenticamente grande e quando a ouvimos de maneira certa - um sentido secretíssimo , acima das palavras , um sentido que não percebemos quando somente palavras ouvimos. Este " sentido oculto" não se encontra ao se ler , como algo falado.O que é então , que percebemos com a música?
A música " não fala de coisas , mas ascende " ao bem e ao mal " ( Wohl und Wehe) como diz a senteça schopenhaueriana que condensa o que foi dito de diferentes formas através dos séculos.Não seria exato dizer que essa sentença expressa o que foi pensado pela grande tradição de pensamento , mas , sim , que ela abre uma via , que permite penetrar no núcleo desse pensamento." Wohl und Wehe " é algo que se insere no âmbito da vontade , do querer , do bonum, do bem , entendido como sentido intrínseco da vontade:" quere" expressa aqui bem..........