I
" Todas as coisas ainda se encontram em esboço
Tudo vive em transformação
Mas o universo marcha
Para a arquitetura perfeita .
Retiremos das árvores profanas
A vasta lira antiga .
Sua secreta música
Pertence ao ouvido e ao coração de todos .
Cada novo poeta que nasce
Acrescenta - lhe uma corda .
II
Uma vida iniciada há mil anos atrás
Pode ter seu complemento e plenitude
Numa outra vida que floresce agora .
Nada poderá se interromper
Sem quebrar a unidade
Um germe foi criado no princípio
Para que se desdobre em plenos múltiplos .
Nossos suspiros , nossos anseios ,
nossas dores .
São gravados no campo infinito
Pelo espírito sereníssimo que preside às gerações .
III
A muitos só lhes resta o inferno .
Que lhes coube na monstruosa partilha da vida
Senão um desespero sem nobreza , e a peste da alma
Nunca ouviram a música nascer do farfalhar das árvores ,
Nem assistiram à contínua anunciação
E ao contínuo parto das belas formas .
Nunca puderam ver a noite
Chegar sem elementos de terror .
Caminham conduzindo o castigo e a
sombra de seus atos.
Comeram o pó e beberam o próprio suor .
Não se banharam no regato livre ...
Entretanto , a transfiguração precede a morte .
Cada um deve realizá - la na sua carne e no seu espírito
Para que a alegria seja completa e definitiva .
IV
É necessário conhecer seu próprio abismo
E polir incessantemente o candelabro que o esclarece .
Tudo no universo marcha , e marcha para esperar .
Nossa existência é vasta expectação .
Onde se tocam o princípio e o fim .
A terra terá que ser retalhada entre todos .
E restituída um dia à sua antiga harmonia.
Tudo marcha para arquitetura perfeita .
A aurora é coletiva ."
[ Murilo Mendes ]
Nenhum comentário:
Postar um comentário